sábado, 3 de outubro de 2009

A toxicidade escolar

Este texto peguei da Galileu nº 219 de Outubro de 2009. Ele é do roteirista e escritor canadense David Gilmour, autor do romance o Clube do Filme.

E aqui já adianto o que o texto acabou me motivando: a educação hoje em dia, nos moldes que se apresenta, intoxica, mutila e destrói o espiríto. Escolas e universidades precisam se reinventar e rapidamente. Hoje, perdemos pessoas curiosas, criativas e inteligentes (potenciais alunos) para internet, TV e até o rádio. E porque? Porque não permitimos que eles busquem as respostas. E mesmo quando permitimos, eles estão tão viciados nessa estrutura escolar gosmenta, que não fazem idéia do que fazer.

Acabamos perdendo estas pessoas porque quando elas optam pela internet o conhecimento chega de forma lúdica, rápida e, porque não dizer, colorida. Ainda que muitas vezes ele chegue aos pedaços e, porque não, errado, o fato de encontrar uma resposta e tê-la encontrada por seu próprio esforço premia o ser curioso.

E hoje o ensino parece, ao meu ver, estagnado. Estagnado em uma forma que por mais que tentamos reinventar nas escolas, acabamos presos a cuspe e giz, pela dificuldade em fazer pesquisa e pelo quantidade de turmas que somos submetidos. Somos máquinas de ensino e formamos outras máquinas. Alunos de universidades que chegam sem ao menos saber escrever ou que sequer imaginam o quanto o raciocínio lógico e criativo lhes foi tolido ao longo dos anos. Como avaliar 40 alunos sem que eles sejam adestrados? Eles mesmos se sabotam perguntando se podemos dar o mesmo exercício na prova. E isso é ensinar?

Eu até entendo que cabe a nós mudarmos isto dentro do que existe. Só que enquanto a estrutura se mantiver dessa forma, vejo muita dificuldade em ensinar de modo criativo e gratificante, tanto para o professor quanto para o aluno.

Boa leitura.

Eu acho que a maioria das crianças deve permanecer na escola. Grande parte delas precisa de uma educação formal. O mundo pode ser muito duro para quem não tem esse recurso. Mas há exceções. Meu filho Jesse é uma delas. Ele é um garoto incomum e precisa de uma educação idem. Para gente como ele, que não suporta ficar com a bunda sentada na cadeira durante horas por dias, meses, anos a fio, escutando alguém falar, a vida escolar é uma experiência tóxica e prejudicial, O tédio o estava deixando doido. E a sensação de fracasso era pior ainda. Para ser sincero, eu também não gostava muito da escola quando era estudante.

Eu achava que Jesse ia acabar deixando os estudos de qualquer jeito, e pior, temia que ele fugisse de casa. Então propus um acordo, quando ele tinha 15 anos: eu permitiria que ele largasse a escola, e ele nem precisaria trabalhar, contanto que ele assistisse a três filmes por semana comigo, escolhidos por mim. Assim começou o nosso Clube do Filme, que durou três anos. Os filmes serviam como um trampolim para as nossas conversas sobre cinema, relacionamentos, sobre a vida.

É claro que eu não diria para um garoto da favela parar de estudar e ir assistir a filmes, porque para muitos deles a educação é sua única esperança de melhorar de vida. Mas meu filho é um privilegiado, cresceu em uma família de classe média, e na época do Clube do Filme eu estava passando por uma má fase profissional como roteirista free lancer, então eu tinha tempo de sobra para ficar com ele.

Os filmes não foram o mais importante, mas sim o tempo que passamos juntos. E foi isso que eu pude dar a Jesse e que a escola não deu: muito tempo com um adulto que ele admirava (por mais pretensioso que isso possa parecer), interessado em suas opiniões, levando-o a sério e reafirmando o quanto ele era inteligente e interessante. Isso deu confiança a ele, a escola estava destruindo sua autoestima. Meninos precisam disso. Porque, se ele não conviver com esse adulto-modelo, vai se deixar influenciar pela personalidade mais forte entre seus amigos. E, se esse cara for um criminoso ou intimidador, o garoto vai ter problemas.
Várias vezes eu temi estar cometendo um erro irreversível. E se ele nunca aprendesse onde fica o Brasil, coisas assim? Mas decidi deixar que ele procurasse aprender as informações conforme precisasse delas.

Depois de três anos, Jesse resolveu voltar à escola e se formar. Começou a estudar literatura na Universidade de Toronto, onde ficou por um ano. Mas decidiu que a faculdade não era mais interessante que o colégio e que não queria terminar o curso. Ele é articulado, confiante, não tem medo de fazer as coisas e fracassar, e adora conversar. As pessoas gostam dele, e essa é uma ótima maneira de conseguir um emprego! Hoje, com 23 anos, Jesse trabalha como chef em um restaurante aqui de Toronto e acaba de escrever e atuar em seu primeiro curta-metragem, que foi comprado por uma produtora local. Ainda tem dúvidas sobre seu futuro profissional. Não quero me vangloriar, mas acho que ele está no caminho certo...

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