terça-feira, 13 de junho de 2006

Koyaanisqatsi => life of moral corruption and turmoil

Esta história tem início antes mesmo do meu nascimento. Há muito tempo atrás meus avós foram adquiridos como escravos no reino de Irari. Meu avô era forte, um ser de invejável capacidade física, e minha avó, sábia, muitas vezes procurada para contar sobre as lendas e mitos do meu povo. Certo dia, eles foram capturados em um momento de distração. Meu avô ainda levou 5 dos seus captores com suas garras, mas isso não foi suficiente. Após ameaçarem a vida de minha avó, ele cedeu.

Foram levados então até Irari, uma cidade pútrida, encravada entre duas encostas e manchada pelo sangue dos inocentes e desavisados. Um mercado negro para todos os tipos de mercadorias, inclusive vidas. Lá, governava o senhor negro Etriluon, O Macabro, conhecido por sua astúcia e sua pouco ortodoxa forma de dirigir seu povo: circo para os ricos, morte para os que nada possuem. Rumores insinuam que além de sua verve sanguinária ele fala com mortos e faz com andem e cambaleiem pelos guetos sujos de Irari.

Meus avós por sorte ou não foram comprados por um senhor de lutas, um gladiador, Ungur, A Mão. Lá meu avô fez um acordo com Ungur dizendo que lutaria pela minha mãe, pois ela não era uma lutadora. Ungur aceitou a barganha. Aos poucos meu avô foi ganhando prestígio entre os lutadores e a platéia. Ele conseguiu até mesmo o respeito de Ungur, que o incentivou a morar perto da arena. Contudo, Ungur nunca lhe deu alforria ou permitiu que meu avô comprasse a liberdade dele, da minha avó ou ambos. Na realidade, meu avô sequer imaginava os planos nefastos do homem conhecido pela alcunha de A Mão.

Os anos passaram rápido. Meu avô tornara-se campeão por diversos anos seguidos, permanecendo imbatível ao longo do tempo. Ungur já percebia que apesar do público ainda ser atraído pelo incrível e único homem-gato era necessário que o campeão desse seu lugar a outro. Era necessário que um luta sem precedentes fosse conseguida. Meu avô teve então dois filhos: Amnitsi e Kunimatzi. Meu pai os ensinou de acordo com as nossas tradições. Amnitsi cresceu forte e bonita. Inclusive os macacos a desejavam. Eles a chamavam de mulher-pantera. Kunimatzi cresceu ainda mais forte e com mais vigor que meu próprio avô. Mas sua mente era fraca. Havia um estranho veneno no seu olhar e seus gestos. Bastet reservava um mundo negro para ele. Amnitsi interessava-se pela arte da luta e pela tradição dos Bagheera na mesma proporção. Era delicada e forte. Ungur acompanhava de longe, mas com extremo interesse o crescimento de Amnitsi.

Entretanto, A Mão agarrou primeiro a alma de Kunimatzi. Ele foi iludido com idéias de macacos, idéias de riqueza e poder que nunca interessaram aos Bagheera. Kunimatzi fora iludido Pela Mão. Comprado com os prazeres dos macacos, ele rapidamente tornou-se um joguete nas mãos de Ungur.

Ungur certa vez foi até meu avô e, como seu dono legítimo, exigiu que ele lutasse pelo título de campeão com o seu mais novo gladiador. Meu avô concordou, pois sabia que este era o seu papel. Ele também sabia que seu corpo era já velho e cansado e que não resistiria muito mais. Se fugir era impossível que pelo menos seus filhos garantissem a sobrevivência da sua velha e adorada esposa. Meu avô foi então até sua família, para que pudesse passar uma última noite com eles antes de sua derradeira batalha. Mas naquela mesma noite, Kunimatzi havia saído. Meu avô ficou muito chateado e ainda que não aprovasse o comportamento dele Kuni ainda era seu filho. Jantou com a filha e a esposa e pôs-se, logo depois, a dormir.

Contudo, durante a fria madrugada, um homem encapuzado entrou sorrateiramente na casa. Amnitsi percebeu a presença estranha e rapidamente se levantou para atacá-lo, mas sua força do intruso era descomunal. Sem cerimônia ele acertou o rosto dela deixando-a desnorteada. Enquanto ela tentava se erguer, o monstro penetrou fundo no seu sexo, arrancado um urro de dor de Amnitsi. Abafando seus gritos ele fornicou com ela até cansar-se da brincadeira. Acordado pela bagunça, meu avô pulou em cima do agressor de sua filha com fúria. O agressor o arremessou longe contra a parede da casa, mas meu avô arrancou-lhe o disfarce. O horror então tomou conta de meu avô ao vislumbrar a face Kunimatzi. Um misto de ódio e nojo se apossou de meu avô. Kuni correu em direção a arena e meu avô o seguiu.

Ao entrar no recinto as tochas foram acesas e A Mão e O Macabro sorriram do alto do seu púlpito. O estratagema tinha dado certo. Ungur apresentou então ao meu avô ainda perplexo seu mais novo gladiador: Kuni. Enfurecido, meu avô pulou sobre Kuni sem piedade. Mesmo assim, Kuni se desvencilhou com a força superior que possuía. Tomado pelo ódio, meu avô jogou-se diretamente na garganta de Kuni, tentando arrancar-lhe o pescoço. Kuni reagiu conforme meu avô lhe ensinara: em um golpe rápido, arrancou-lhe a garganta. Etriluon sorria. Seu intuito parecia ter sido alcançado. Enquanto isso, Ungur apresentava um semblante estranhamente desconfortável. Etriluon então proclamara um novo campeão: Kunimatzi. Kunimatzi vibrava, pois alcançara seu sonho. A platéia urrava de prazer.

Infelizmente para ele, o sonho transformou-se em pesadelo em poucos segundos. Uma lança era enfiada com fúria contra o seu corpo. Amnitsi vingava-se agora do seu irmão, sangue do seu sangue. Aliada a outros gladiadores, enfurecidos com a traição de Ungur e com a morte do meu avô respeitado como campeão, um incêndio foi iniciado na arena. O Macabro viu guardas mortos sendo atirados por sobre o muro da platéia e Ungur fugiu desesperado.

Etriluon sumiu rapidamente. Ninguém percebeu ou imaginou como. Amnitsi correu para junto do corpo do seu pai, se esvaindo em lágrimas sem entender porque tudo isso ocorreu. Os gladiadores ainda retiraram a força o corpo do meu avô e Amnitsi da arena antes que tudo desmoronasse. Agarrada a ele, Amnitsi chorava copiosamente.

Não havia mais nada ali. Não havia mais o jugo de Ungur sobre os Bagheera desgarrados. Gladiadores, Amnitsi e minha avó fugiram para as montanhas a leste tentando ultrapassá-las. O conhecimento de sobrevivência de minha avó salvara a todos. Mais tarde, no alto da Montanha Verde, viu-se uma pira ofuscada pelo incêndio da Grande arena de Irari. O corpo de meu avô fora na montanha cremado. Dizem que a Grande Arena ao raiar do dia já havia desmoronado restando apenas cinzas. Nenhum corpo fora encontrado naquele local. A Montanha do Fogo, como agora é conhecida a Montanha Verde, permaneceu com sua a pira acesa durante 7 noites.

A fuga levou as duas filhas de Bastet para uma cidade pequena de um amigo gladiador. Lá elas ficaram escondidas e, aos poucos foram se recuperando da triste tragédia. Um mês após o ocorrido, Amnitsi contou aos prantos que carregava o Filho do Monstro dentro si: estava grávida. Ela pegou uma faca e antes que pudesse dar cabo da própria vida e da do bebê, minha avó segurou sua mão. Ela então lhe disse que a obrigação dela era agora mostrar que O Monstro poderia ter gerado vida dentro dela com o seu ato vil e cruel, mas que a vida possuía o sangue Bagheera e que ele seria mais forte que o desejo incutido em Kunimatzi pelos macacos.

Então eu nasci. Minha mãe permitiu minha chegada até Gaia. Em Gaia, conheci minha avó que me ensinou tudo sobre os ventos, a chuva, a visão e o contato com os espíritos e a magia Bagheera. Minha mãe, Amnitsi nunca me rejeitara. Desde o princípio ela me contou tudo e me explicou que eu deveria ser a antítese de tudo que meu pai foi. Ela foi carinhosa e mesmo com o ódio que forjou a ferro e fogo seu coração, ela não tinha receio de me amar. Quando finalmente entendi tudo que minhas fundamentais tutoras me ensinavam chorei por um dia inteiro. Enlouquecido, fui até a Montanha do Fogo. Lá encontrei o espírito do meu avô que abençoou minha alma. Ele me explicou que eu não tinha culpa do passado e que a justiça viria se assim eu quisesse.

Voltei e abracei minhas tutoras com amor. Eu finalmente me sentia livre do sangue odioso do meu pai. No dia seguinte minha avó sumira. Seu corpo fora encontrado em chamas, no mesmo local que meu avô fora cremado. Ela havia deixado um triste bilhete dizendo que sua missão estava cumprida e que agora ela iria em paz. Nesta vida cruel que minha mãe teve, chorei abraçado a ela, mais uma vez.

Minha mãe me ensinou tudo que meu avô lhe ensinara. Hoje volto a Irari para encontrar meu destino: vou me tornar gladiador. Dizem que um velho recruta lá. Tomara que ele seja Ungur. Depois, cuspirei sobre a cabeça decepada dO Macabro. E então, farei o ritual de conclamação das almas perdidas e vingarei a honra de minha mãe e meus avós enfrentando o espírito maligno de meu pai.

Um comentário:

  1. Aê!!! Reafirmo o que eu já disse desta história em outra oportunidade: MUITO BOA!
    Há mais o que dizer sobre o texto, mas grande parte eu já disse para o autor, então hoje ficarei por aqui mesmo.

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